Pequenas e médias empresas ignoram responsabilidade compartilhada

Toda empresa terá de descrever o ciclo de vida de seu produto e a operação de tratamento dos resíduos gerados

Oito de cada dez pequenas e médias empresas (PMEs) não sabem, até o momento, que a lei que criou a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) já está em vigor e que elas têm prazo até agosto para começar a atender às suas determinações.  Esta é a avaliação que Dórli Terezinha Martins, consultora do Sebrae, faz ao cabo de uma ampla programação de encontros com pequenos e médios empresários no âmbito do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), para explicar o conceito de logística reversa. No entanto, a nova legislação ambiental, regulamentada em 2010, tem como eixo central a responsabilidade compartilhada entre governo, empresas e população na questão dos dejetos urbanos; obriga fabricantes, importadores, distribuidores e vendedores a recolher e destinar corretamente o lixo produzido ao longo do ciclo de vida do produto e determina que toda empresa faça um plano de gerenciamento de resíduos.

À exceção das pequenas e médias empresas com faturamento anual inferior a R$ 2,4 milhões, que geram apenas resíduos sólidos domiciliares (papel e lixo comum), nenhum outro empresário poderá se furtar às exigências do Decreto nº 7.404, que regulamenta a PNRS, que também determina o fim dos lixões até 2014 e o descarte em aterros sanitários apenas dos materiais que não podem ser reciclados. A logística reversa - a coleta e retorno de materiais à indústria após o consumo - passa a ser obrigatória para alguns setores. Sancionada a lei, resta saber: como motivar o grande contingente de PMEs a aderir à engrenagem da coleta e venda de materiais recicláveis, que, segundo estimativas da LCA Consultores para o Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), faturou nada menos que R$ 712 milhões em 2012? "Este setor ainda está em um processo incipiente; não tem ações definidas", lamenta a consultora do Sebrae, lembrando que, na maioria dos casos, circula a ideia errônea de que a lei só diz respeito aos grandes.Para que as pequenas e médias empresas contribuam com a logística reversa, é preciso investir em divulgação, insiste Dórli Terezinha: "Os sindicatos patronais, as prefeituras e estados e o próprio Sebrae devem destrinchar a informação e repassá-la ao empresariado".Elas devem ser informadas, por exemplo, que, pela nova lei, toda empresa terá de descrever o ciclo de vida de seu produto e a operação de tratamento dos resíduos gerados durante sua fabricação. Isso vai além do bê-á-bá de fazer uma coleta seletiva de materiais, reusar água, quando possível, e economizar energia. Consiste em ter um entendimento abrangente de toda a cadeia de matérias-primas e insumos da qual faz parte e supõe formar multiplicadores, treinando funcionários para que implantem e se adaptem a uma nova cultura sustentável. Ou, como explica o presidente do Cempre, Victor Bicca Neto, há que ter consciência de que, aos olhos da lei, não existem mais empresários individuais: "Arranjos produtivos que consideram os elos e engrenagens da atividade, desde o insumo básico até o reprocessamento da sucata para fabricação de novos produtos, são estratégicos para a expansão do mercado da reciclagem. Ou seja, a responsabilidade compartilhada pelos resíduos, eixo central da nova legislação para o setor, reforça a importância dos atores e seus diferentes papéis".      Longe de gerar prejuízos e encarecer os custos de produção, as pequenas e médias empresas também devem estar cientes de que a aplicação da lei pode gerar novas oportunidades de negócio ao dar vazão a um maior volume de resíduos separados. Segundo Bicca Neto, "em 2012, a coleta, triagem e processamento dos materiais em indústrias recicladoras geraram um faturamento de R$ 10 bilhões no Brasil e a expectativa para os próximos anos é de uma significativa expansão no ritmo do desenvolvimento do parque industrial de reciclagem". Para Joseph Couri, presidente do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi), caberá à imprensa veicular o papel de cada um no processo de logística reversa: "O comerciante terá de instalar locais específicos para recolher o lixo dentro do seu negócio, à indústria caberá retirar os produtos e encaminhá-los para reciclagem ou reúso", adverte. Caio Magri, diretor-executivo de operações, práticas empresariais e políticas públicas do Instituto Ethos, acredita que a construção e o fortalecimento de vínculos de negócios sustentáveis entre empresas compradoras e fornecedoras, que incluam a figura do catador de materiais recicláveis e suas cooperativas, podem gerar bons resultados na direção da sustentabilidade. Para tanto, o Ethos vem apostando num novo paradigma para a cadeia produtiva da reciclagem,  pelo qual as empresas são orientadas a adquirir matéria-prima e produtos reciclados e a doar materiais para as cooperativas e a sociedade a consumir mais e separar seus materiais recicláveis e doá-los para catadores e cooperativas. Segundo Magri, os resultados da aproximação do setor empresarial do trabalho desenvolvido pelas organizações de catadores têm sido promissores, em todo o País, desde 2006, quando, em parceria com a Fundação Avina, o Ethos lançou o programa Vínculos de Negócios Sustentáveis em Resíduos Sólidos.    Segundo levantamento da LCA Consultores, o Brasil gera, diariamente, 193.642 toneladas de lixo. Em 2012, 27% dos resíduos urbanos recicláveis (fração seca) coletados foram efetivamente recuperados, sendo desviados dos lixões e aterros e retornando à atividade produtiva. Em se tratando de embalagens, por exemplo, o índice de recuperação é mais alto: 65,3%.

Você pode gostar também
Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado.

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Vamos supor que você esteja de acordo com isso, mas você pode optar por não participar, se desejar. Aceito Mais detalhes