'Estupro culposo': entenda a sentença atribuída ao caso Mariana Ferrer

O juiz entendeu que o crime pelo André Aranha deveria ser acusado não consta na constituição ou código penal brasileiro. Por isso, foi inocentado.

“Excetíssimo, eu tô implorando por respeito”, foi o que a influencer Mari Ferrer disse quando estava sendo atacada pelo advogado de defesa de André Aranha, durante o julgamento. O The Intercept Brasil teve acesso aos registros do processo de Aranha, que estuprou a jovem em dezembro de 2018. No vídeo os advogados de defesa humilham Ferrer, vítima do estupro, sem intervenção do juiz. O acusado foi absolvido com a presunção de que ele teria cometido um estupro culposo, sem “intenção”. Com os registros, o caso de Mari Ferrer gera uma nova série de revoltas.

Entenda o caso

Mariana Ferrer é promotora de eventos e seu nome e história vieram à tona no ano de 2019, quando a garota expôs o estupro que sofreu em 2018, em uma boate em Jurerê, Santa Catarina. À época, o processo corria e sigilo, mas Mari resolver contar o que aconteceu em suas redes sociais. Contudo, em agosto de 2020, seu Instagram foi tirado do ar, até o momento, Mari não conseguiu recuperar sua conta.

Segundo o relato da jovem, o estupro ocorreu no dia 15 de dezembro de 2018, em uma festa no Café de la Musique, em Jurerê Internacional. Ela afirma ter sido drogada, pois a única bebida que tomou foi um copo de gim e não se lembra do que ocorreu. O acusado no caso é o empresário André Aranha. O rapaz é conhecido por empresariar jogadores de futebol e manter amizades famosas, como Gabriel Jesus. No dia do acontecido, Aranha estava acompanhado do herdeiro da Rede Globo, Roberto Marinho Neto.

Foto mostra andré aranha, que foi absolvido por estupro culposo
Empresário andré aranha (foto: reprodução)

O vídeo da boate mostra que o empresário sobe as escadas com Mariana alterada, por volta de 22h da noite. Após um tempo, Mari Ferrer desce cambaleando e André logo atrás.

A jovem denunciou o agressor e reuniu a acusação reuniu uma série de provas. O exame de DNA comprovou o sêmen de Aranha na roupa de Mariana, que também estava manchada de sangue.

Além disso, imagens vazadas da câmera de segurança mostram que a jovem estava alterada e desce uma escada junto com o agressor. Mari também postou prints pedindo socorro a amigas que estavam no local, pelo aplicativo de conversa WhatsApp. Na época, Mari Ferrer tinha 21 anos e trabalhava como promoter da festa. Laudos comprovaram que a menina era virgem antes do estupro.

Sentença inédita de estupro culposo

Inicialmente, Aranha havia sido condenado pelo promotor Alexandre Piazza por estupro de vulnerável, quando a vítima está sob efeitos entorpecentes ou álcool e não é capaz de consentir ou se defender. Ele também solicitou a prisão preventiva do acusado, que foi aceita pela justiça, mas foi derrubada em liminar em segunda instância pela defesa de Aranha. Contudo, quando o então promotor deixou o caso para assumir outra promotoria. Quem levou a acusação adiante foi Thiago Carriço de Oliveira, que classificou o crime como “estupro culposo”, segundo ele Aranha não teria como saber que Mariana não estava consciente de suas ações. Por isso, seria um estupro sem “intenção”.

O juiz, Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, acatou a ideia e absolveu o réu. Justificou que esse crime não existe na constituição ou código penal brasileiro. E por isso, o juiz disse que não é possível condenar alguém por um crime inexistente. “Como as provas acerca da autoria delitiva são conflitantes em si, não há como impor ao acusado a responsabilidade penal, pois, repetindo um antigo dito liberal, “melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente”, escreveu o juiz na sentença, que foi acessada pelo portal JusCatarina.

Imagens do julgamento
Imagens do julgamento (foto: reprodução/the intercept brasil)

Revolta nas redes sociais

Mesmo com sêmen e sangue na roupa da vitima, além das imagens das câmeras, o juiz optou por inocentar o empresário por falta de provas. Mas o que chocou o público novamente hoje (03) além da justificativa foi o registro do julgamento.

O The Intercept Brasil teve acesso ao vídeo do julgamento do empresário. As imagens mostram o advogado de Aranha humilhando Mari Ferrer. Durante o processo, ele mostra diversas fotos da garota, que seriam motivo para duvidar de sua virgindade. Além de dizer que suas postagens eram falsas e ela estaria fazendo um “showzinho” para ganhar fama e dinheiro. Cláudio Gastão da Rosa Filho disse que as fotos da modelo para seus trabalhos seriam “ginecológicas”, como definiu. E continuou dizendo que “Só aparece essa sua carinha chorando. Só falta uma auréola na cabeça. Não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso, e essa lágrima de crocodilo”. O advogado também disse que nunca gostaria de ter uma filha do “nível” de Mariana, ou que seu filho conhecesse uma mulher assim.

Foto mostra advogado de andré aranha, cláudio filho
Advogado de defesa (foto: juscatarina)

A jovem, claramente abalada, pede por respeito e diz “Excelentíssimo, eu tô implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”.

Mas o juiz ignora e um membro do tribunal diz que caso queira ela poderia tomar água para se recompor e depois continuar o julgamento. Contudo, nenhum dos três homens que estavam presentes no julgamento fez objeção aos comentários de Cláudio Gastão da Rosa Filho. Veja o vídeo do The intercept Brasil:

https://www.instagram.com/tv/CHIWWGpp6JG/?utm_source=ig_embed

Após a divulgação do vídeo nas redes sociais, ativistas e mulheres se manifestaram revoltados e pedindo por justiça por Mari Ferrer, novamente.

Desde 2019, quando a promoter contou seu relato, as pessoas já se revoltaram e subiram a hashtag #justiçapormariferrer. Contudo, hoje (03) o assuntou voltou à tona os usuários fazem o mesmo pedido. Além de comentarem que não existe estupro culposo, sem “intenção” de estuprar. Confira alguns tweets:

Segundo o The Intercept Brasil, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos disse que remeteu ofícios às corregedorias do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e do Ministério Público de Santa Catarina, à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Conselho Nacional de Justiça e Conselho Nacional do Ministério Público para que os órgãos investigassem as condutas dos profissionais que estavam presentes na audiência. Em contato com o veículo, a OAB afirma que chamou o advogado Cláudio Filho para prestar esclarecimentos. Mas não deu mais informações, pois o processo corre em sigilo.

Mariana apenas recebeu o direito de ter o tratamento psicológico dela, de sua mãe e irmã menor, pagos pela boate, Café de la Musique, em que o crime ocorreu.

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