Fraude bilionária leva à bloqueio do consignado do INSS
Medida é consequência do combate a fraude que atingiu aposentados

Os aposentados e pensionistas não poderão solicitar empréstimo consignado do INSS por tempo indeterminado. A medida anunciada pelo presidente do Instituto Nacional do Seguro Social, Gilberto Waller Júnior, acontece em meio as investigações da Polícia Federal, que revelou esquema que desviou R$ 6,3 bilhões dos beneficiários.
O bloqueio atende o Tribunal de Contas da União (TCU), que determinou a suspensão dos benefícios para empréstimos até que o beneficiário solicite o desbloqueio.
“Determino o bloqueio dos benefícios para averbação de novos descontos de empréstimo consignado, para todos os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social, independente da data de concessão do benefício”, diz o despacho de Gilberto Waller Júnior.
Como funcionava a fraude no INSS?
A fraude consistia na filiação automática de aposentados e pensionistas a entidades de classe — principalmente sindicatos e associações de aposentados — sem o consentimento dos beneficiários. Essas entidades passaram a cobrar mensalidades diretamente dos benefícios pagos pelo INSS, por meio da autorização automática de consignações no contracheque, utilizando códigos vinculados ao Dataprev.
Estima-se que o dinheiro seja de mais de R$ 6 bilhões tenham sido desviados entre 2019 e 2024. A Polícia Federal identificou 11 organizações, muitas delas de fachada, envolvidas no esquema. A maioria dos contratos não contava com provas de autorização dos filiados. Em muitos casos, os aposentados sequer sabiam que estavam sendo filiados ou que valores estavam sendo descontados mensalmente de seus proventos.
Cerca de 1,2 milhão de aposentados foram afetados, segundo auditorias internas do INSS. Os valores descontados variavam entre R$ 8 e R$ 50, mas, quando acumulados por anos e multiplicados por centenas de milhares de beneficiários, geraram prejuízos astronômicos. Muitos dos aposentados atingidos vivem com o salário mínimo e relataram que os descontos indevidos comprometiam sua subsistência.
As entidades envolvidas alegam que os aposentados autorizaram os descontos, mas investigações revelaram uma ausência quase total de documentação comprobatória. Além disso, foram identificados casos de documentos falsificados e filiações forjadas digitalmente.
Suspensão do consignado do INSS
Diante da gravidade do caso, o governo federal determinou, em abril de 2025, a suspensão temporária dos empréstimos consignados para beneficiários do INSS, como medida preventiva. A suspensão permitiu uma revisão do sistema de consignações e interrompeu temporariamente as ações de entidades suspeitas. A decisão gerou polêmica, pois também impactou beneficiários que dependiam do crédito para cobrir despesas emergenciais.
O presidente Lula classificou a fraude como “uma traição ao povo brasileiro” e autorizou a Advocacia-Geral da União (AGU) a ingressar com ações contra as entidades envolvidas, buscando a recuperação dos recursos desviados. O Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) também iniciaram apurações paralelas.
Um ponto sensível do caso foi o envolvimento indireto de Frei Chico, irmão mais velho do presidente Lula e ex-dirigente do Sindicato Nacional dos Aposentados (Sindnapi), com sede em São Paulo. Documentos mostraram que o Sindnapi recebeu recursos desviados por meio de filiações não autorizadas. Embora não haja indícios diretos de que Frei Chico tenha se beneficiado do esquema, a associação política gerou repercussão negativa e ataques da oposição, que fala em “blindagem” institucional.
O governo tem reforçado que as práticas investigadas começaram ainda no governo Bolsonaro, e que as mudanças atuais visam justamente erradicar essas estruturas herdadas.
Como fica o aposentado?
Para os aposentados prejudicados, o governo anunciou que os valores descontados indevidamente serão ressarcidos. Um grupo de trabalho entre INSS, AGU e Dataprev foi criado para revisar cada caso individualmente. O atendimento pelo Meu INSS foi reforçado, e canais presenciais nas agências estão recebendo demandas de revisão.
Segundo a AGU, os primeiros reembolsos devem ocorrer ainda em maio, com prioridade para os casos com maior grau de vulnerabilidade social.
O que será feito para evitar novas fraudes
- Revisão completa dos convênios entre INSS e entidades representativas
- Bloqueio de códigos de desconto suspeitos
- Criação de um sistema de duplo fator de autenticação para autorizar descontos
- Monitoramento em tempo real de novas filiações e alterações no contracheque
- Também está em estudo um novo marco legal para os consignados, com regras mais rígidas sobre autorização e fiscalização.
Impactos econômicos e sociais
Além do dano direto aos aposentados, a suspensão do consignado afeta o mercado financeiro, especialmente bancos e financeiras que operam com crédito para idosos. Estima-se que, só em abril, houve uma queda de mais de R$ 1 bilhão em operações de crédito. Economistas alertam para possíveis reflexos no consumo de famílias e no setor varejista.
Por outro lado, a exposição do esquema gerou um debate importante sobre transparência nos sistemas públicos, proteção a idosos e ética institucional.